30 novembro 2006

Os "novembrinos" fazem pausa para "publicidade" e como têm a mania de se exceder - para o bem e para o mal - vão transbordar, só aqui, para Dezembro.


29 novembro 2006

LUCHINO VISCONTI (nascido a 2 de Novembro de 1906)


"No ano em que subiu o pano no Scala". Segundo as palavras do próprio, referindo-se ao seu ano de nascimento.

Na imagem, uma cena de um dos meus filmes de culto, "O Leopardo", baseado no romance de Tomás de Lampedusa.

Este excelente autor, coloca na voz da principal personagem, a clarividente "máxima", que preside a várias "revoluções":

"É PRECISO QUE ALGO MUDE, PARA QUE TUDO FIQUE NA MESMA"

Nota: Este filme contou, para além do realizador, com mais 2 "novembrinos": Burt Lancaster (2 de Novembro) e Alain Delon (8 de Novembro).

Curioso, não é?

MARIA SKLODOVSKA CURIE - (nascida a 7 de Novembro de 1867)

É o/a único/a cientista a quem foram atribuídos dois PRÉMIOS NOBEL.
P. Nobel da Física (1903)
P. Nobel da Química (1911)
Einstein disse de Maria: "É de todas as pessoas célebres, a única a quem a fama não conseguiu corromper."

Vale a pena conhecer a sua extraordinária vida e biografia. Onde constam as suas pioneiríssimas descobertas científicas, as teses, as dificuldades e os triunfos.
Aliás, fazia parte das biografias muito difundidas, na minha infância.
Agora há umas coisas "florivelas" e outras mazelas...
Ah, e as praxes asnáticas dos caloiros.

26 novembro 2006

Os "novembrinos" abrem alas para MÁRIO CESARINY DE VASCONCELOS (nascido a 9 de Agosto de 1923)


A maior homenagem que se pode fazer a um poeta é tê-lo decor, sem esforço nenhum.

Assim, sem ir à estante, aos títulos, às páginas, faço gotejar a memória, porventura com alguma palavra inexacta:
__________________________________

Entre nós e as palavras há metal fundente
..........................................................................
Entre nós e as palavras (...) o nosso dever falar.

____________________________________

Em todas as ruas te perco
em todas as ruas te encontro,
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a medir a tua altura

E bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura,
tanto, tão perto, tão real
onde um braço teu me procura,
em todas as ruas te perco
em todas as ruas te encontro

_______________________________

(de certeza com inexactidões de pontuação, pelo menos)

René Magritte (nascido a 21 de Novembro de 1898)


Toda uma definição de Arte, aqui:

pelo tipo de objecto representado
pela sua figuração/desfiguração
pela inclusão de palavras nesse espaço
pelo que elas indefinem

(Possivelmenre, alguém já disse algo de semelhante. Mas, conhecendo bem o quadro, ou outro qualquer, com que travámos relação especial, surgem-nos sempre - porque os nossos olhos mudaram, desde o último encontro - palavras in(é)ditas.)

25 novembro 2006

Claude Monet -(nascido a 14 de Novembro de 1840)



Auto-retrato com boina basca (1886)

Belo homem. Belo pintor. Um impressionista de "ar livre".
Não me importava de conviver diariamente com qualquer dos seus quadros.

20 novembro 2006

Amadeu de Souza-Cardoso - (nascido a 14 de Novembro de 1887)

Menina dos Cravos -1913

Óleo sobre madeira

40x29 cm

Museu do Caramulo - Caramulo, Portugal

Nota: Continuarei, aleatoriamente, a postar "novembrinos" (como diz uma cara amiga), até ao fim deste mês. E como já verificaram,em bastantes, não existem datas de óbito. Porque eles nunca morrem.


17 novembro 2006

VIVIEN LEIGH - nascida a 5 de Novembro de 1930


Aqui está Vivien/Scarlett, nos braços do Gable/Rhett em Gone with the wind.

Foto antológica, de um filme antológico, baseado num livro não menos antológico de MARGARET MITCHELL (nascida a 8 de Novembro de 1900).

Pela rutilância irresistível, nesta época, desta superprodução fílmica, o livro, em alguns países, ficou mais em segundo plano.
Aliás, creio que com a concordância da autora, o "script" sofreu algumas alterações.
Digamos que a Scarlett do filme é um pouco menos "wild", talvez por concessões da altura, mais ou menos hollywoodianas, ao "standard" de 1.ª figura feminina.

Assim, Scarlett tem 2 filhos de dois casamento, anteriores ao efectuado com Rhett Butler, filhos, que são eclipsados do filme, assim como o seu desafecto maternal em relação a eles. Facto que no romance lhe é verberado pelo 3.º marido, Reth, que enceta uma sincera cruzada de amor paternal à pequena Bonnie, filha de ambos, procurando assim substituir, em relação a si próprio e à criança, o inatingível amor de Scarlett, sempre obcecada pela adolescente fidelidade a uma paixão platónica, juvenil e ilusória, por Ashley.

Mas, a figura de Scarlett é fascinante. Também pelo desprezo que mantinha pela hipocrisia das convenções sociais, que remetiam a mulher para leques, fngimentos calculistas, chiliques e caça de marido.

Ela era de uma perspicácia irónica, apesar de muito jovem, e de uma energia inquebrantável.

Reli diversas vezes, muitas partes do livro. Particularmente uma em que ela, diante do espelho, com as crinolinas e vestidos, visualiza qual deles a tornará irresistível perante o noivo de outra, lamentando não poder mostrar as pernas, bem torneadas, e pensando no servilismo palerma e pusilânime das suas contemporâneas.

Também como documento da "Guerra da Secessão" norte-americana, o livro é excelente. O esboroar de um mundo de "algodão, escravos e uma tremenda dose de arrogância", como dizia o renegado social, Rhett Butler, é notavelmente narrado.

As questões esclavagistas são abordadas de diferentes pontos de vista. As relações complexas de dominação/submissão, antes e depois da "abolição", são patentes, ao longo da digese.

Uma outra grande escritora HARRIET BEECHER STOWE, (1811), igualmente norte-americana escreveu um livro célebre "A Cabana do Pai Tomás", um verdadeiro libelo anti-esclavagista, onde os heróis são os "escravos".
Também esta escritora, que teve 7 filhos, assegurou a subsistência da família, com o produto de aulas e do seu trabalho literário. Para quem interessar, consulte no "Google".

11 novembro 2006

FIODOR DOSTOIEVSKY (nascido a 11 de Novembro de 1821)


Há cerca de dois anos, estava eu numa "Bertrand" de um centro comercial e ouvi um cliente jovem, perguntar pelos "Irmãos Karamazov".

Aquilo fez-me erguer a cabeça, soou-me a música celeste e despertou em mim uma absurda saudade dos tempos em que se lia Tolstoi, Camus, Sartre, Gide,Goethe, Romain Roland, etc e os demais que nos faziam respirar a Vida, para além do cinzentismo e tacanhez onde crescíamos.

Mas o empregado da livraria perguntou, clicando nas teclas do computador:
-É recente ? O nome é dosti...quê???

Bem feito, para as minhas "nostalgias" literárias.
Mas, não me posso queixar. Porque além de o ler e reler na minha adolescência, tive ocasião de visitá-lo na "Necrópole dos Artistas", em S. Petersburgo, perto de Tchaikovsky - outro de Novembro, acho -.

Porque eu estou-me a borrifar para esses modismos "churrasqueiros" de fornos crematórios.
Sou por uma sepultura, onde se possa ir meditar, de preferência fora de datas "santas", e constatar o nosso futuro.
Nesse ponto - e noutros - estou em paz, com a minha Cultura Ocidental.

10 novembro 2006

GENTE DE NOVEMBRO -Mário Cláudio (nascido a 6 de Novembro de 1941)


de DOIS EQUINÓCIOS


Do mesmo copo insisto em beber,
no mesmo lugar, ou noutro perfeito,
como se a morte, a vigilante, te não invadisse.

E a água era a das fontes eterníssimas,
nascidas para acabar, como nós, cavaleiros,
que nenhum livro legítimo folheássemos, amigo.

Que conheço de ti, que já não aprendesse?
O pai bêbado? O irmão injectado?
O amor depois disso.


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Dolorosa é a sorte dos solitários apanhadores de lapas
inserindo uma lâmina ainda, entre a concha e rocha,
desalojando-as, depois, com atente tristeza,

porque assim procediam seus avós pré-históricos,
que levavam aos menires o resultado da safra,
e dormiam, ao sol, sob a benção dos ídolos.

Um paquete singra, agora.
E continuam na lida, pobres seres sem país,
com palmeiras nos olhos, com os dedos lanhados.


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Outras vezes era a página, e falo do areal, ainda,
porque nem um vapor singrava, diluído em névoa azul,
nem pregão se sentia, muito alvo, do vendedor ambulante.

Pinchavam os pulgões, enlouquecidos, no limiar da praia,
desmoronavam-se os fortins, inconsistentes, em sua inábil arquitectura,
escrevia um garoto o nome, Rui Manuel, com a timidez do polegar.

Quanto aos cães, farejavam o rasto do Verão
entre tábuas e tábuas, dadas à costa,
até que as vagas do equinócio os viessem escorraçar.


(1996)
Mário Cláudio

08 novembro 2006

GENTE DE NOVEMBRO - Jorge de Sena - (nascido a 2 de Novembro de 1919)


CARTA A MEUS FILHOS
SOBRE OS FUZILAMENTOS DE GOYA


Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível, que ele seja
aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém
de nada haver que não seja simples e natural.
Um mundo em que tudo seja permitido,
conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,
o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.
E é possível que não seja isto, nem sequer isto
o que vos interessa para viver. Tudo é possível,
ainda quando lutemos, como devemos lutar,
por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer delas uma fiel
dedicação à honra de estar vivo.
Um dia sabereis que mais que a humanidade
não tem conta o número dos que pensaram assim,
amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,
de insólito, de livre, de diferente,
e foram sacrificados, torturados, espancados,
e entregues hipocritamente à secular justiça,
para que os liquidasse "com suma piedade e sem efusão de sangue".
Por serem fiéis a um deus, a um pensamento,
a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas
à fome irrespondível que lhes roía as entranhas,
foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,
e os seus corpos amontoados tão anonimamente quanto haviam vivido,
ou suas cinzas dispersas para que delas não restasase memória.
Às vezes por serem de uma raça, outras
por serem de uma classe, expiaram todos
os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência
de haver cometido. Mas também aconteceu
e acontece que não foram mortos.
Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,
aniquilando mansamente, delicadamente,
por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.

Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror,
foi uma coisa, entre mil, acontrcida em Espanha
há mais de um século e que pror violenta e injusta
ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,
que tinha um coração muito grande, cheio de fúria
e de amor. Mas isto nada é, meus filhos.
Apenas um episódio, um episódio breve,
nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis)
de ferro e de suor e sangue e algum sémen
a caminho do mundo que vos sonho.
Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém
vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.
É isto que mais importa - essa alegria.
Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto
não é senão essa alegria que vem
de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez
alguém está mewnos vivo oun sofre ou morre
para que um só de vós resista um pouco mais
à morte que é de todos e virá.
Que tudo isto sabereis serenamente,
sewm culpas a ninguém, sem terror, sem ambição,
e sobretudo sem desapego ou indiferença,
ardentemente espero. Tanto sangue,
tanta dor, tanta angústia, um dia
-mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga -
não hão-de ser em vão. Confesso que
muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos
de opressão e crueldade, hesito por momentos
e uma amargura me submerge inconsilável.
Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,
quem ressuscita esses milhões, quem restitui
não só a vida, mas tudo que lhes foi tirado?
Nenhum Juízo Final, meus filhos, poderá dar-lhes
aquele instante que não viveram, aquele objecto
que não fruíram, aquele gesto
de amor, que fariam - amanhã -.
E, por isso, o mesmo mundo que criemos
nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa
que não é só nossa que nos é cedida
para a guardarmos respeitosamente
em memória do sangue que nos corre nas veias,
da nossa carne que foi outra, do amor que
outros não amaram porque lho roubaram.

Lisboa, 25/6/1959

Jorge de Sena

06 novembro 2006

GENTE DE NOVEMBRO - Sophia de Mello Breyner Andresen (nascida a 6 de Novembro de 1919)



O poema "Fúrias" foi publicado inédito na hífen n.º2, acompanhando um outo, "Estelas", da mesma autora, igualmente inédito, à época.



FÚRIAS

Escorraçadas do pecado e do sagrado
Habitam agora a mais íntima humildade
Do quotidiano. São
Torneira que se estraga atraso de autocarro
Sopa que transborda no fogão
Caneta que se perde aspirador que não aspira
Táxi que não há
Recibo extraviado
Empurrão cotovelada espera
Burocrático desvario

Sem clamor e sem olhar
Sem cabelos eriçados de serpentes
Com as meticulosas mãos do dia a dia
Elas nos desfiam

Elas são a peculiar maravilha do mundo moderno
Sem rosto e sem máscara
Sem nome e sem sopro
São as hidras de mil cabeças da eficácia que se avaria

Já não perseguem sacrílegos e parricidas
Preferem vítimas inocentes
Que de forma nenhuma as provocaram -
Por elas o dia perde seus longos planos lisos
Seu sumo de fruta
Seu fresco de flor
Seu marinho alvoroço
E o tempo é transformado
Em tarefa e pressa
A contra tempo

Jan. 88

Sophia de Mello Breyner Andresen

Cadernos de Poesia Hífen n.º2, Porto, 1988
Direcção: Inês Lourenço
Desenho da capa: José Rodroigues
Concepção gráfica: Tiago Manuel

05 novembro 2006

GENTE DE NOVEMBRO - Teixeira de Pascoaes - (nascido a 2 de Novembro de 1877)



Novembro, o mês da vocação secreta das profundidades, dos limos, do destino dos corpos descendo à terra, mas também o da constante transmutação, do vitalismo nunca emudecido, da sedução agreste do negro por uma rigorosa e extrema luz. - I.L.
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A SOMBRA DE EURÍDICE, I


Canção divina as cousas comovia,
E de ternura as árvores choravam...
E lembrava o luar a luz do dia
E os ribeiros, extáticos, paravam.

Era Orfeu, de inspirado, que descia
Às entranhas da terra! E se afundavam
Os olhos na noite, muda e fria,
Onde as pálidas sombras vagueavam.

Eurídice, o seu morto e triste amor,
Ouvindo-o, tomou forma e viva cor,
Íntima luz à face lhe subiu...

Mas Orfeu, pobre amante enlouquecido,
Quis ver aquele corpo estremecido...
E, outra vez sombra, Eurídice fugiu...


Teixeira de Pascoaes